Por Láira Kétory Calixto – acadêmica da 5ª fase de Jornalismo da UNISUL
Era um dia frio. Lembro-me bem de que no rádio e na TV não se falava em outra coisa a não ser em que na madrugada anterior os termômetros haviam marcado e confirmado que havia sido a mais fria dos últimos tempos e por consequência o dia também. Então, minha mãe, como a maioria das mães, me disse: “Se agasalhe bem minha filha, leve o guarda-chuva, luvas, toca e cachecol”.
Dessa vez até dei razão para ela, pois realmente estava frio e estava com uma bronquite daquelas. Mas nada que tirasse o brilho da noite e que me fizesse desistir de ir naquele local e curtir tudo o que aquele dia podia me proporcionar. Além de tudo, tinha uma tarefa de conclusão de disciplina do Curso de Jornalismo da Unisul para cumprir.
Ao descer do ônibus avistei algumas figuras um pouco excêntricas que me acompanharam até a frente do Centro de Eventos da UFSC. Era tudo muito bonito. Foi impossível não parar em frente daquele gigante de concreto e não admirar suas formas coloridas. No entanto, mal sabia eu que o melhor ainda estava por vir.
Depois de sentir aquele cheiro hipnotizante de pipocas quentes e fresquinhas de uma figura ilustre, tomei coragem e subi a rampa. E já com o folder de exibição do FAM nas mãos fui imaginando qual filme assistir.
Porém, ao adentrar o hall de acesso aos auditórios do Centro de Eventos da Universidade Federal algo me chamou muito a atenção. As pessoas que se encontravam por lá, aquelas pessoas excêntricas não eram exceção por lá. Parei por um momento e pensei: “A minha calça de oncinha e meu casaco de pele passarão despercebido por aqui, e mais, já sei sobre o que falarei, qual será minha pauta para a cobertura do evento, como não pensei nisso antes? Falar de pessoas é maravilhoso”.
Comecei a observá-las. Colegas que falava comigo logo percebia que não lhe dava ouvido. Só tinha olhos para aquelas pessoas. O motivo do encantamento não era só pelas roupas coloridas, rasgadas, cabelos coloridos, barbas por fazer, cavanhaque e estilos psicodélicos. Seus diálogos eram interessantes, linguagem de cineastas e comportamento de quem é muito culto e ao mesmo tempo descolado. É engraçado, mas eles se comportavam como pessoas modernas. No entanto, eram altivos porque agiam influenciados pelo conhecimento e cultura que acreditavam dominar tendo como pano de fundo uma teoria pré-estabelecida.
Enquanto esperava sentei-me no banco e presenciei a conversa de um rapaz cujo sotaque já conferia ser do nordeste com uma moça paulista. Após breve apresentação, fizeram uma análise dos filmes que viram juntos. Eu, na minha humilde figura, segui para a exibição dos curtas daquele dia. O primeiro foi Titanes, um curta chileno que me deixou paralisada, perplexa; na verdade, confesso que não entendi muito o enredo. O segundo era Árbol, uma produção argentina que me fez dar o braço a torcer para los hermanos. Um curta simples e bonito. Em seguida foi exibido o Janela Molhada, um filme pernambucano engraçadíssimo que fez conexões com o passado, com a análise dos filmes naturais e suas ideologias e com a janela molhada. Já o último que assisti, esse me embriagou de vez. Fez-me caminhar para o centro de mim e mergulhar em uma série de incógnitas e dúvidas daquela imensidão azul.
Lógico que minha análise não chegava nem aos pés daqueles que estavam atrás de mim. Enquanto os curtas eram apresentados, faziam análise de câmera, de cena, de expressão, de luz, de som e enredo. E eu? Humildemente avaliava os atores, a história e o som. “Viu aquele take?” ou “Aquela luz não favoreceu a cena”, ou ainda: “O corte foi preciso, mas acho que seria legal deixar a cena desenvolver-se um pouco mais”. Mas como na vida existe a chance de arriscar, mesmo sem um conhecimento técnico de filme exerci o de espectadora que se sentiu tocada por uma obra.
Após assistir Árbol a primeira coisa que me veio à cabeça foi a seguinte frase:
Joia rara que apresento
Nesta paisagem em que me vejo
No centro da paixão e do tormento
Sem nenhuma ilusão
Neste cenário de tristeza
Relembro momentos de real bravura
Dos que lutaram com ardor
Em nome do amor à natureza
Nesta paisagem em que me vejo
No centro da paixão e do tormento
Sem nenhuma ilusão
Neste cenário de tristeza
Relembro momentos de real bravura
Dos que lutaram com ardor
Em nome do amor à natureza
Amor à Natureza- Paulinho da Viola
O curta me fez sentir como Paulinho, ou seja, o homem sentia frio, seus filhos e sua mulher também. No entanto, quando chegava até perto da árvore vinha um turbilhão de emoções que o fazia sentir tormento, amor e tristeza tudo em nome de um amor sem tamanho a uma árvore que tinha uma copa tão bonita que a tornava um tesouro, uma joia.
Cada vez que o velho homem procurava uma saída que não fosse o sacrifício da árvore, suas opções iam se esgotando, entretanto, a emoção falava mais alto e ao contrariar a razão me recordei de mais um trecho da canção Amor à Natureza:
Flutua no ar o desprezo
Desconsiderando a razão
Que o homem não sabe se vai encontrar
Um jeito de dar um jeito na situação
Uma semente atirada
Num solo fértil não deve morrer
É sempre uma nova esperança
Que a gente alimenta de sobreviver
Desconsiderando a razão
Que o homem não sabe se vai encontrar
Um jeito de dar um jeito na situação
Uma semente atirada
Num solo fértil não deve morrer
É sempre uma nova esperança
Que a gente alimenta de sobreviver
Saí embriagada. E ao chegar ao carro pensei: “Não posso ficar só com esta noite”. Então, peguei meu guia do FAM e planejei ir até lá mais uma vez. Dois dias depois fui e escolhi ver algo que me deixa mais feliz que poesia, crianças. Foi interessante. Assistir a dois curtas, um da Paraíba chamado Coisa de Menino com Menina, que confesso foi uma lição para mim também. O outro era uma produção da minha terra querida Minas Gerais, e se chamava Musicaixa, um nome bem propício para quem acreditar viver em um mundo como uma caixa de música.
Como no primeiro dia, meu foco foram as pessoas, e isso não desabilita os curtas e os fórum, haja vista que as pessoas são partes integrantes do FAM. Conversei com as professoras, mas faltava algo. Não que os que elas falaram fosse mentira, mas também não eram as suas verdades, parecia algo ensaiado. Parti para o plano “B”: falei com os telespectadores e o que eles disseram foi simples, porém aliado ao brilho nos olhos e o sorriso em seus lábios já me mostraram o que o festival significou para cada um daqueles picorruchos.
Os acadêmicos da 5ª fase do curso de Jornalismo da Unisul - disciplina Produção em Impressos - sob a supervisão da professora Raquel Wandelli, estão fazendo a cobertura do FAM como atividade curricular do semestre.